Olinda e Aloisio Magalhães

1982

Cultura – Patrimônio

MEC – Departamento de Documentação e Divulgação

OLINDA PATRIMÔNIO CULTURAL

Afinal o sonho de Aloisio Magalhães se converteu em realidade: Olinda foi elevada a Patrimônio Cultural da Humanidade, título conferido pelos 21 países integrantes do Comitê do Patrimônio Mundial da Unesco, no dia 14 de novembro do ano passado, durante reunião plenária daquela entidade, em Paris.

Essas palavras, registradas em Cultura nº 36, são de um artista comprometido com a cultura brasileira e que desapareceu sem ver concretizado um dos seus sonhos. Nelas se identifica o esboço do projeto que Aloisio Magalhães traçou ao assumir a Secretaria da Cultura do MEC, projeto de que fazia parte a inclusão de Olinda na lista dos monumentos considerados pela Unesco como Patrimônio Histórico da Humanidade.

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Localizada numa superfície ondulada de altiplanos, identificados por morros em tabuleiros que não ultrapassam os 60m de altitude, Olinda domina os baixios da planície do rio Beberibe e, mais ao longe, o porto natural protegido por arrecifes de corais.

Ainda no século XIX, surgiu outra transfiguração: a Lei das Biqueiras eliminou os belíssimos beirais de telhas e de cornijas — a cidade foi neoclassizada.

No entanto, ocorreram nesse período alguns fatores que a revalorizaram: a instalação dos cursos jurídicos, em 1827, a ligação férrea com Recife, em 1847, e a generalização dos banhos de mar. Esses fatores propiciaram o afluxo dos burgueses da região, que se instalaram próximo à Cidade Alta.

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O desenvolvimento cultural deve ser entendido como a busca de uma trajetória de evolução que objetiva elevar de forma harmoniosa e coerente a qualidade de vida da comunidade brasileira. Como, no Brasil, o espaço cultural se caracteriza pela pluralidade e diversidade de culturas, para cumprir seu objetivo essa estratégia deve ter como base a compreensão das dinâmicas culturais e o respeito aos valores de vária natureza em que estes se apoiam.

Mas nenhum tão alto que seja uma penitência subir devagar, num fim tranquilo de tarde pernambucana. Quem subir pela primeira vez uma rua velha de Olinda que se lembre de tão grande esquisitão dos tempos coloniais; que se lembre também dos desesperados da justiça do século que outrora subiram estas mesmas ruas para se queixar ao bispo; que se lembre dos outros homens que há (Gilberto Freyre, 1980)

Assim concebeu Olinda o sociólogo-antropólogo Gilberto Freyre em seu 2º guia prático, histórico e sentimental da cidade brasileira. O rio, as janelas dos sobrados, as igrejas, os mosteiros e conventos, as casas velhas, suas bicas, paços, altos, são analisados de maneira carinhosa, gostosa e, sobretudo, saudosa pelo auto de Casa-grande & senzala, que dedicou profundos estudos sobre a histórica cidade.

Olinda, de velhos casarões coloniais, de becos, vielas e ruas estreitas, sendo a mais famosa a do Amparo, com seus sobradões de varanda em estilo morisco, de casas conjugadas de porta-e-janela, permitindo um convívio muito íntimo entre vizinhos, com praças conhecidas pelo povo como da Preguiça, do Jacaré, esquecido dos seus nomes oficiais, pois a Praça da Preguiça na verdade é da Abolição, dos conventos de paredes manchadas pelo tempo, alguns pouco lembrados, como o de Nossa Senhora do Monte, onde as monjas contemplativas rezam no fim da tarde o ofício e pedem a Deus paz para a humanidade, das igrejas barrocas, do seminário mais antigo do País.

É o que deixa claro, por exemplo, nestas observações que fizera a propósito de Olinda:

“Quando propusemos Ouro Preto, era algo evidente, por sua grande unidade e homogeneidade conceitual, o fato de ser um flagrante processo histórico do País, o seu tamanho e beleza. Era a primeira vez, não conhecíamos bem os critérios e era necessário ter bastante segurança. Intuitivamente, veio agora a ideia de apresentar Olinda, pelo contraste com Ouro Preto. Esta é a cidade da montanha, da pedra, do barroco mineiro, uma cidade escura, de horizonte curto. Olinda é uma cidade verde, à beira do mar, com um espaço vegetal tão importante quanto o próprio monumento. Mesmo a sua arquitetura não é tão definida. Ouro Preto é, claramente, o barroco mineiro do Ciclo do Ouro. Em Olinda, parte de uma casa é do século XVII; outra, do século XVIII. Lá está o primeiro monumento da arquitetura moderna, a caixa d ‘água do arquiteto Nunes, ainda da década de 30. Ali houve a fundação dos cursos jurídicos. Há um acúmulo de vivências que justificam a inclusão de Olinda no Patrimônio da Humanidade”.

Lembrando o começo da cidade, Aloisio disse que

ela renasceu em cima das ruínas provocadas pelo incêndio que a destruíra.

Agora, pode-se afirmar que o artista renasce na concretização do seu sonho de a ver elevada àquela condição.

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