Aloisio Magalhães: depoimento citado

 Joel Pontes

1966

O teatro moderno em Pernambuco

  • p. 64

Teatro do Estudante de Pernambuco

  • p. 71

Por isso, não houve no Teatro do Estudante um princípio geral, um ponto de partida doutrinário capaz de acolher todos os seus integrantes. Dizia-se que o lema era levar o bom teatro ao povo em vez de esperar que o povo fosse ao teatro mas reconhecia-se, enfim, que a educação artística, conduzida até as últimas consequências, faria com que o povo fosse ao teatro e até criasse, ele próprio, os seus dramaturgos, técnicos e atores capazes de imprimir uma individualização nacional às atividades cênicas.

Fatores unitivos eram a fraterna amizade entre todos, um evidente desejo de estarem juntos, que os levava à Faculdade de Direito durante o dia, mesmo o de outras Escolas, e à residência de Hermilo Borba Filho à noite, para ensaios e discussões por vezes acaloradas. Lia-se, escrevia-se, traduzia-se do inglês, francês e espanhol, em do teatro mas também das artes em geral e da filosofia — perigoso campo de desencontros, quando se defrontavam nietzscheanos, marxistas e neo-tomistas. Sartre e os mais recentes
pensadores eram desconhecidos, mesmo porque a carência de dinheiro, somada à falta de atualização das bibliotecas do Recife, impedia a leitura de publicações recém-saídas.

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As poucas disponibilidades eram dedicadas a discos, obras de teatro e poesia. As mesmas leituras e admirações reuniam o pessoal do TEP: Langston Hughes, Sandburg, Wright, A Renascença Negra em geral (inclusive jazz), Lorca, Gabriela Mistral, Gallegos, Rice, O’Neill, Eliot, os poetas da Resistência francesa, os pintores expressionistas, Bach, Mozart,
Prokofiev, Stravinski, e os artistas brasileiros Portinari, Villa-Lobos, Graciliano Ramos, Vinícius de Moraes, Carlos Drummond de Andrade.

Luiz Maurício Britto Carvalheira

1986

UT Libraries 2008

Por um teatro do povo e da terra: Hermilo Borba Filho e o TEP

  • p. 104

… democrática, aberta, (Lembre-se que) nós estávamos em 1946, época da
redemocratização. Claro que havia toda uma postura democrática no sentido de uma socialização, de uma política de privilegiar as coisas de massa, as coisas de forma autêntica, sem dúvida nenhuma; mas não havia uma conotação político-ideológica de esquerda, conclui.

José Laurênio de Melo, ponderando os fatos, sintetiza: “A posição geral do Teatro do Estudante — como um todo, como grupo, também como movimento de pessoas — era, digamos, uma posição democrática.  Isto foi desde o princípio e até o momento em que a gente começou a se dispersar”.

Era comum aos jovens que não se decidiam por medicina ou engenharia
frequentarem a Faculdade de Direito — explica Magalhães

“para se sentirem com formação universitária, de nível superior, e depois decidir”.

Ainda segundo ele, o núcleo central do grupo, em sua maioria, era composto por jovens nessa situação. Iam à Escola, diariamente, mas não assistiam às aulas; reuniam-se numa mesma mesa no restaurante da faculdade e aí liam, discutiam ideias e livros, articulavam as tarefas que seriam depois, tudo pretextando reuniões e encontros:

“havia uma intercomunicação muito grande — dos livros, das ideias, das discussões — que ia desde poesia, teatro e romance à sociologia, à política…”

Entrevista-depoimento que nos concedeu Aloisio Magalhães em sua residência de Olinda-PE, a 6 de fevereiro de 1982.

  • p. 105

Por sua vez, Aloisio Magalhães afirma:

Hermilo sempre teve muitos livros. Coisa fantástica: Ele tinha a mania de ler. . . E a gente lia tudo. Para dar uma ideia, nós líamos Henry Miller quando ele era publicado somente por uma editora em Paris, que publicava em inglês, chamada ‘Olympic Press’. Pois bem: nós líamos isso em quarenta e seis, quarenta e sete, por causa de Hermilo.

Diz José Laurênio: “De 1946 (eu …

Ao que Aloisio completa, no quadro que pinta a respeito do grupo: (…) a emulação de estar junto, discutir, ouvir disco, tomar ‘porre’, fazer farra (…) era uma …

  •  p. 223

— dentro dessa nova linha adotada por Hermilo — foi um teatro para agitar aquela ‘mesmice’ provinciana da época”.

Comentando o nível artístico dos espetáculos, Aloisio Magalhães considera-os

“uma coisa extremamente acima do usual”

e lembra:

“Estávamos preocupados com fazer, fazer bem, fazer o melhor. A música de fundo era escolhida com muito cuidado; os desenhos que eu fazia para os cenários eram sempre discutidos, tudo sendo pretexto para uma reunião”.

Interpelado também sobre uma possível pretensão de se ensinar o povo, Magalhães responde:

“Em certo sentido, eu diria que sim. Mas, não ensinar. Eu acho que aí é muito duro. Tinha a pretensão de oferecer, de trazer o povo para um nível de percepção mais alto. Claro que a gente não conseguia”.

De qualquer modo, fica claro o sentido de missão — de cruzada — de que estavam imbuídos os estudantes e o seu diretor. É significativa a conclusão a que chega Hermilo, numa avaliação final da experiência, quando aponta as dificuldades encontradas para se levar adiante esse programa: Letras assinadas nos bancos da praça para pagamento  de dívidas inadiáveis e um sentido de frustração …

“O TEP era mesmo um grupo fechado porque ele estava dentro de uma linha, dentro de
princípios…

O relacionamento social com os outros grupos era bom, mas não resta dúvida de que ele era olhado assim de esguelha. E por quê?